Nicolas Cage enlouquece em “The Surfer”, um filme caótico e perturbador

Nicolas Cage enlouquece em “The Surfer”, um filme caótico e perturbador

2 Maio 2025 Não Por Pedro Luís Lobo

Desde clássicos como Wake in Fright até Wolf Creek, o cinema australiano tem retratado o país como uma terra selvagem e implacável, especialmente para forasteiros ousados o suficiente para enfrentar o árido interior. No novo filme The Surfer, Nicolas Cage dá vida ao mais recente personagem a descobrir que visitantes não são bem-vindos nas costas da Austrália. No entanto, à medida que a narrativa avança, torna-se claro que os verdadeiros perigos enfrentados pelo protagonista não estão no exterior, mas dentro da sua mente.

Selecionado para o Festival de Cannes de 2024 e com estreia marcada para 2 de maio, The Surfer mergulha num cenário de loucura sombria, onde o desespero e a fúria tomam conta da tela. Cage, vencedor de um Óscar, entrega uma performance intensa e desconcertante, ajustando-se perfeitamente ao tom surreal imposto pelo realizador Lorcan Finnegan. Num enredo que inclui até um rato morto à pancada, o ator volta a demonstrar o seu talento para explorar os limites da sanidade, navegando por emoções como luto, arrependimento e raiva psicótica.

Na trama, o protagonista interpretado por Cage — cujo nome nunca é revelado — pretende surfar com o filho (interpretado por Finn Little) em Luna Bay. O seu objetivo é comprar a casa à beira do penhasco onde cresceu com o pai, numa tentativa de impressionar o rapaz e, mais tarde se descobre, reconquistar a ex-mulher. No caminho até à praia, um incidente com um surfista local que o empurra e o insulta é o prenúncio da receção hostil que os espera. Antes mesmo de entrarem na água, um residente grita: “Não moram aqui, não surfarão aqui!”

É então que surge Scally (Julian McMahon), um homem de capuz vermelho que, de forma mais cordial, explica que o grupo conhecido como “Bay Boys” não tolera estranhos. Aconselha-o a engolir o orgulho e a ir embora. O protagonista obedece, mas regressa pouco depois, sozinho, no seu Lexus, e liga ao agente bancário para tentar fechar o negócio da casa. Descobre, no entanto, que há outro interessado, o que aumenta ainda mais a sua ansiedade.

A tensão mental crescente do protagonista é transmitida visual e sonoramente por Finnegan através de closes desfocados, imagens desconcertantes de uma figura misteriosa no mar, zooms cegantes para o sol, ruídos opressivos e uma mistura de sons — grilos, ondas e aves estridentes — que parecem zombar do protagonista. Desde o início, The Surfer transmite uma sensação de desorientação, como se o espectador estivesse a sofrer de insolação, com a mente a queimar e a visão turva.

O argumento de Thomas Martin insinua desde cedo que algo está errado com o protagonista. Um telefonema de um colega de trabalho questiona por que motivo ele não está no escritório, visto que tirou um “dia pessoal”, e revela que no dia anterior conduziu uma reunião descalço. Apesar desses sinais de alerta, o enredo evita explicações diretas, mantendo o público em constante dúvida sobre o que é real e o que é fruto da perturbação mental do personagem.

Um dos momentos mais simbólicos dessa confusão ocorre quando o Surfer confronta um sem-abrigo (interpretado por Nic Cassim), que cola um cartaz sobre um cão desaparecido no para-brisas do seu carro. O protagonista reage com fúria desproporcional, num claro indício de que está à beira de um colapso.

Em suma, The Surfer é um mergulho profundo na psique de um homem à deriva, retratado com ousadia visual e intensidade dramática por Nicolas Cage. O filme mistura thriller psicológico com crítica social e uma pitada de delírio existencial, num cenário australiano que é tão hostil quanto fascinante.